domingo, 28 de abril de 2019

S. Tiago de Fontans


S. Tiago de Fontans

É o nome mais antigo que se conhece, da freguesia de Fontão. Vem do catálogo das igrejas portuguesas do tempo do rei D. Dinis, na História da Igreja Portuguesa, da autoria de Fortunato de Almeida. Era, pois, o nome pelo qual se denominava a terra de Fontão, pelo menos desde o Séc. XIII.
Mas, pelo dito catálogo, ficamos também a saber que sendo a freguesia pequena, pagava de rendimentos ao fisco mais do que o dobro do que era cobrado a qualquer outra das freguesias da região, mesmo daquelas que eram maiores, tanto em riqueza como em extensão. Pagava mais ou menos o mesmo que as duas paróquias da então recente Vila de Viana. Enquanto as freguesias vizinhas pagavam de rendimentos, entre as cinquenta e as setenta libras, a de Fontão estava taxada em duzentas e sete libras.
Porquê tal diferença? Qual o rendimento que justificava este substancial agravamento? Mais uma vez, faltam os documentos. Estamos num ambiente rústico. Mas, temos alguns indícios. E vamos encontra-los na toponímia da terra: S. Tiago de Fontans. As Fontans, isto é, as Ribeiras.
E uma dessas Ribeiras chama-se Rego do Talho. Talvez se chamasse assim já naquele tempo. As águas do Ribeiro deviam correr com aspeto nauseabundo, como insinua o nome porque era conhecido, e que vem no mapa dos serviços cadastrais: Rio Podre. Sinal que o talho era real e se encontrava por alturas do lugar do Retiro, despejando os seus detritos na Ribeira. Esta Ribeira terminava num “Valo”, fundeadouro ou varadouro de pequenas embarcações, que pelo Rio Lima comunicavam com o mar. Nesse Valo ou fundeadouro colocaram os nossos antepassados o lendário “Tear de Ouro”. Que outro significado pode ter este tear, que não seja o de um negócio produtivo?
Mas, continuemos pesquisando a toponímia.
Para montante do Talho e Rio Podre, e seguindo o Rio Velho, encontramos o lugar do Toural e, mais para cima, as pastagens do Ameal e os campos planos das Neves, regadas pelas águas frescas que descem da Silvareira, indiciando também que gados e pastagens são vigiados desde as elevações do lugar das Torres.
Todos estes topónimos, enquadrados num conjunto ordenado e harmónico, nos sugerem uma
intensa criação de gado; e uma florescente industrialização e futuros negócios de carnes e curtumes.
As peregrinações, o turismo desse tempo a Santiago de Compostela e à Terra Santa ou a Roma; e, mais tarde os Cruzados, que nas terras da Galiza e Norte de Portugal, marcavam o seu ponto de encontro, dinamizaram estes criadores e exploradores de gado. Deste modo, o rendimento do negócio aumentou o volume dos encargos.
D. Afonso Henriques aliou-se a estas gentes e deles beneficiou para o seu projecto. Protegeu-os com os seus “Serenos”, guardas da noite, e talvez funcionários do seu fisco, ao mesmo tempo que lhes garantia segurança nos caminhos e vela nas suas noites.
Assim continuava a ser, nos tempos dos seus filhos e seus netos.
Quando terminou esta prosperidade em Fontão?
Tenho para mim, que no momento em que o Matadouro do Toural se mudou para Viana, o Talho passou a ser uma memória fossilizada e, o Rego do Talho deixou de ser o Rio Podre.
Os Fontanenses de hoje, perderam a memória, mas transportam ainda, no fundo do subconsciente, a nostalgia desses tempos ancestrais em que viveram prósperos e foram auto-afirmativos, rejeitando agora as novas realidades, que não aceitam. E é isto que constitui a sua actual singularidade.

Anselmo Vieira

Arqueólogo

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