quarta-feira, 2 de outubro de 2019

Bretónia



Bretónia

Cidade ou empreendimento?

Fontão nunca foi vila Romana. Foi, no máximo um lugarejo que, como muitos outros, se situava em volta da Lagoa de Bertiandos e que integravam o território da lendária cidade de Bretónia.
Lendária porque, mesmo que referida por vários escritores, alguns Romanos, o seu assento nunca foi encontrado pelos arqueólogos que, afanosamente, buscaram vestígios que a identificassem.
No meu entender, porque a referida cidade não assentava em sólidas estruturas arquitetónicas.
Consistiria num mero empreendimento económico, numa unidade agropecuária de criação de gado bovino, exploração das suas carnes e rentabilização das suas peles.
Esta unidade estendia-se por um domínio senhorial, de rico proprietário, e apoiava-se em vários locais, ao redor da lagoa, para a produção, industrialização e exportação dos seus produtos.
Os autores Romanos que a ela se referiram, e à sua prosperidade, falaram do que ouviram lá de longe, em Roma, sem se darem conta da sua fragmentação por um território disperso, e confundiram o empreendimento, com uma cidade.
Os autores posteriores falaram do seu desaparecimento e caíram na mesma confusão.
Não se tratava, pois, de uma cidade, mas de uma unidade produtora que chegou a atingir um êxito fabuloso, propagado pelas vozes da fama.
A própria lagoa deve ter sido incluída nessa mesma unidade como fonte piscícola. E todo o conjunto incluído na propriedade do rico senhor Romano.
Só isto explica, o à vontade com que pode mais tarde, abrir sobre a lagoa, o Rio da Vala e a
construção da Ponte Nova sobre o mesmo. Devia ser um Senhor, e grande Senhor.
A abundância de águas no território garantia as pastagens.
O Rio Podre concentrava a exploração das carnes associado que está ao Talho, Rego do Talho, ao Toural, concentração de animais para o abate e ao Amial vigiado pelas torres. O Valo, sobre a Veiga do mesmo nome, onde jaz o Tear da lenda, era o ponto de exportação.
A indústria dos curtumes estava localizada no Rio Estorãos, onde trabalhavam os pisoeiros.
O centro administrativo deve ter estado situado entre as freguesias de Sá e Bertiandos.
Os Romanos investiram muito nesta terra. Além de consolidarem os caminhos antigos, construíram três pontes, só em Fontão. Ainda há restos de calçadas. Há restos de poldras. E duas vias Romanas: uma que segue junto às regadas da veiga e outra que se aproxima da Serra D’Arga e segue para o Rio Estorãos, que atravessa numa ponte, bela e útil obra de engenharia. Não longe, fica a ponte de Arcozelo.
Todas estas obras acabaram por dar nome à terra: Terra dos Arcos de Lima. Só mais tarde o nome se subalterniza para Terra de Ponte, em documentos de Fernando I, Rei de Leão.
Tudo nos indica que o território começou a ser dividido, no tempo dos Suevos, princípios do Séc. V.
No século IX, o território parece ter sido quase totalmente apagado pelo abandono. Fala-se de investidas Vikings. Há indícios de destruição e, sobre ele, caiu um manto de esquecimento.
Terra sem Rei nem Lei. Terra de ninguém, chamar-lhe-á, nos fins do século X Almançor, que por aqui se cruzou, com imensas dificuldades. Mas, ainda nos princípios do mesmo século, Afonso III das Astúrias, apelidava esta terra pelo nome da Vale de Ovínea.
Na senda de Afonso III das Astúrias, por aqui se afadigou, tentando organizar o território, o Bispo S. Rosendo. Tinha aparecido, entretanto, o Mosteiro de S. João D’Arga e algumas paróquias.
Era o nascimento das atuais Freguesias, dotadas de certa autonomia, fundadas sobre os antigos lugarejos.
O apagão vai-se dissipando.
Mas, a Bretónia dos autores Romanos e medievais, não mais surgiu à luz do dia, por mais que Historiadores e Arqueólogos se esforçassem.
No entanto, desta terra mantêm-se as caraterísticas de uma só comunidade homogénea e ancestral. E, com o mesmo género de atividades, que seriam as do empreendimento de que falei.
Lembro-me ainda, que sendo criança, entre os meus sete e dez anos, foi o povo destas Freguesias convocado para uma Romaria de Rogativas, a pedir chuva ao céu. Fui com os de Fontão e juntamo-nos em S. Pedro, junto da Igreja, com as gentes da terra. De lá, dirigimo-nos para a igreja de Estorãos onde encontramos, concentrado, o povo de Sá, de Bertiandos, de Santa Comba e de Moreira do Lima.
Com mais de dez andores, formamos uma procissão destinada à Igreja de Sá. Com súplicas, rezas e rogativas, entremeadas de prédicas e clamores, posemo-nos a caminho, debaixo de um sol ardente.
A cerimónia terminou a meio da tarde. Em pouco temo fizéramos todo aquele caminho, e eu, apesar de criança, fiquei com a sensação, de que não tínhamos saída da minha terra, pois todo
aquele ambiente me parecia familiar.
E as Freguesias?
Continuam a ser os mesmos lugarejos, que o empresário Romano daquele tempo, com tanto esmero administrou e tornou famosos nos tempos de então.
E tenho para mim a suspeita, que nos tempos mais prósperos do empreendimento, esse empresário pode ter sido alguém da família Imperial de Teodósio, da família de Gala Plácida.

22-09-2019

Anselmo Vieira

Sem comentários:

Enviar um comentário